Por Ana Barberino
As favelas brasileiras movimentam bilhões de reais por ano e desenvolvem soluções de sustentabilidade que o “asfalto” ainda está tentando entender. Mas o reconhecimento oficial dessa potência econômica parece estar sempre um passo atrás da realidade.
O Fórum Mundial das Favelas, que participou do G20 Social no ano passado, mostrou às grandes potências mundiais que os discursos sobre desenvolvimento sustentável não vêm mais apenas dos centros urbanos tradicionais.
As soluções nascidas nas comunidades estão provando ser mais eficazes — e lucrativas — do que muitas iniciativas convencionais de economia circular.
O modelo é simples na teoria, complexo na execução. Áreas que antes serviam como depósito de lixo se transformaram em cooperativas de reciclagem, associações e instituições que geram renda através da transformação de resíduos.
Essas operações não apenas cuidam do material reciclável, mas constroem uma economia que se fortalece e contribui — muitas vezes sem reconhecimento — para o desenvolvimento sustentável do país.
“A favela que hoje arrecada bilhões, desenvolve empreendedores, transforma seu lixo em recurso ainda não deve ser ouvida e reconhecida como potência?” questiona um dos organizadores do fórum.
O problema da infraestrutura
O modelo funciona, mas ainda falta suporte. A infraestrutura intelectual e social necessária para consolidar essas iniciativas como economia circular de fato não acompanha o ritmo das soluções criadas nas comunidades.
Cooperativas operam sem o suporte técnico adequado. Empreendedores desenvolvem produtos inovadores a partir de materiais recicláveis, mas enfrentam dificuldades para escalar seus negócios.
O resultado é um ecossistema econômico robusto que opera, em muitos casos, na informalidade — gerando valor, mas sem o reconhecimento ou os incentivos que recebem iniciativas similares em outras regiões da cidade.
A resistência ao reconhecimento
Para alguns observadores, a relutância em reconhecer as favelas como potência econômica e ambiental reflete mais do que questões técnicas ou de infraestrutura.
“Será que toda esta tentativa de afastamento do reconhecimento é o receio de saber que aqui grandes gênios circulam e transformam a favela dia a dia?” provocou um dos líderes comunitários durante o fórum.
A pergunta expõe um incômodo: as favelas não apenas sobrevivem à margem da economia formal, como desenvolvem modelos que poderiam inspirar políticas públicas mais amplas.
A economia circular nas favelas acontece por necessidade, não por planejamento. E talvez seja exatamente isso que a torna tão eficiente.
Resta saber quando — e se — o Brasil vai reconhecer oficialmente essa realidade.